26 de agosto de 2016

Princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso

Boa tarde,
Hoje o meu post centra-se em torno do princípio da proibição do excesso, e sem querer fugir muito à linha de estudo, é importante fazer aqui, antes de mais, uma nota quanto à semântica utilizada. Enquanto que a maioria da doutrina e da jurisprudência constitucional utilizam mais frequentemente a terminologia de «princípio da proporcionalidade» (em sentido lato), o Professor Reis Novais mostra a sua preferência por «princípio da proibição do excesso», enquanto princípio mais abrangente, fazendo parte dele como um dos seus elementos constitutivos, o da proporcionalidade (em sentido estrito).

E, portanto, a ideia chave e que permitirá navegar mais aprofundadamente neste princípio é a de que as relações que se estabelecem entre particulares e Estado estão sujeitas à liberdade e à autonomia dos particulares. E, nesses termos, a ingerência do Estado na autonomia dos particulares ou qualquer restrição da sua liberdade tem de ser encarada como uma exceção, e tem de estar, como tal, limitada e condicionada ao preenchimento de requisitos pré-estabelecidos, sob pena de ser considerada constitucionalmente ilegítima.

Posto isto, para percebermos a importância do estudo do princípio da proibição do excesso é necessário compreender que todo o direito fundamental, visto como um todo, é constitucionalmente consagrado no pressuposto de ter eventualmente de ceder perante outro bem, direito ou valor digno de proteção jurídica que, no caso, apresente um maior peso. E essa eventual cedência é feita através de uma restrição do direito fundamental.
Ora, daqui podemos retirar que os direitos fundamentais não são absolutos.  Desde logo, pensemos na possibilidade de estarmos perante dois direitos fundamentais em colisão.
Pegando num exemplo dado por  Vieira de Andrade de que, será que podemos punir por homicídio um pai que, por convicção religiosa, não permite que se faça uma transfusão de sangue a um filho menor, e que é necessária para o manter vivo?
Neste exemplo, estão aqui em causa dois direitos fundamentais: a liberdade religiosa e o direito à vida. E como é que se resolveria este problema? A solução para esta colisão tenderia para: tratando-se de direitos iguais ou da mesma espécie, devem ambos os titulares ceder na medida do necessário para que todos produzem igualmente o seu efeito, não havendo um maior detrimento para uma das partes; mas já se os direitos forem desiguais ou de espécie diferente, então aí prevalecerá o que se deva considerar superior.
Mas, o que aqui se passa é que é muito difícil, em abstrato, estabelecer uma hierarquia entre os bens constitucionalmente protegidos, de forma a obtermos uma resposta que permita sacrificar sistematicamente os menos importantes - até porque a Constituição protege diversos valores ou bens em jogo e não é válido sacrificar pura e simplesmente um deles ao outro.
Como mais à frente iremos ver, com o desenrolar da exposição acerca deste princípio, é perante as dimensões interligadas da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito, que se impõe que a escolha entre as diversas maneiras de resolver a questão no caso, se faça em termos de comprimir o menos possível os valores em causa, segundo o seu peso nessa situação.

E, portanto, para ficarem aqui com uma ideia, é neste sentido que o princípio da proibição do excesso irá atuar. Seja para resolver situações em que o Estado toma medidas que possuem encargos excessivos para os particulares ou que contendam com um direito fundamental dos mesmos, seja também para resolver um conflito entre direitos fundamentais.

Neste tópico introdutório, vou apenas fazer referência à evolução constitucional que aqui se deu.
Ora, antes de 1982, não existia na Constituição qualquer referência expressa à proporcionalidade; esta só surgiu com a revisão desse ano, em que se acolheu expressamente o princípio da proibição do excesso quando, no art. 18.º, n.º 2 CRP, diz "devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos". Neste seguimento, e com a revisão constitucional de 1989, consagrou-se finalmente o princípio da proporcionalidade, no art. 19.º CRP, ao fazer parte dos requisitos a preencher pelas declaração e execução dos regimes de estado de sítio e estado de emergência, bem como no art. 266.º CRP, nos princípios fundamentais que regem a atuação da administração. Por sua vez, no mesmo sentido, o legislador ordinário, no art. 5.º, n.º 2 do Código do Procedimento Administrativo, erigiu o princípio da proporcionalidade em limite das decisões da Administração que afetem direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos dos particulares.

Posto isto, e como é referido pelo acórdão n.º 634/93, este princípio, lá definido como princípio da proporcionalidade, subdivide-se em três sub-princípios, que são:
   - princípio da adequação;
   - princípio da exigibilidade; e
   - princípio da justa medida ou da proporcionalidade em sentido estrito.
Esta decomposição do princípio da proibição do excesso pelos seus vários elementos constitutivos apresenta importantes vantagens no campo dos controlos a realizar para aferir da constitucionalidade ou não das restrições, mas esse será um ponto que mais adiante irei referir.

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